Vai pelo cais fora um bulício de chegada próxima,
Começam chegando os primitivos da espera,
Já ao longe o paquete de África se avoluma e esclarece.
Vim aqui para não esperar ninguém,
Para ver os outros esperar,
Para ser os outros todos a esperar,
Para ser a esperança de todos os outros.
Trago um grande cansaço de ser tanta coisa.
Chegam os retardatários do princípio,
E de repente impaciento-me de esperar, de existir, de ser,
Vou-me embora brusco e notável ao porteiro que me fita muito
mas rapidamente.
Regresso à cidade como à liberdade.
Vale a pena sentir para ao menos deixar de sentir.
Álvaro de Campos
2 comentários:
Não o amor, mas os arredores é que vale a pena...
A repressão do amor ilumina os fenómenos dele com muito mais clareza que a mesma experiência. Há virgindades de grande entendimento. Agir compensa mas confunde. Possuir é ser possuído, e portanto perder-se. Só a ideia atinge, sem se estragar, o conhecimento da realidade.
Bernardo Soares, in "Livro do Desassossego"
Belo poema. Está de parabéns pelo blog.
Abraços
Chico de Assis
www.chicodeassispoesia.blogspot.com
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