terça-feira, 22 de maio de 2012

Bem, Hoje Que Estou Só e Posso Ver

















Bem, hoje que estou só e posso ver
Com o poder de ver do coração
Quanto não sou, quanto não posso ser,
Quanto, se o for, serei em vão,

Hoje, vou confessar, quero sentir-me
Definitivamente ser ninguém,
E de mim mesmo, altivo, demitir-me
Por não ter procedido bem.

Falhei a tudo, mas sem galhardias,
Nada fui, nada ousei e nada fiz,
Nem colhi nas ortigas dos meus dias
A flor de parecer feliz.

Mas fica sempre porque o pobre é rico
Em qualquer coisa, se procurar bem,
A grande indiferença com que fico.
Escrevo-o para o lembrar bem.
  Fernando Pessoa

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